Abandonados

O tempo não para e não nos damos conta de como ele passa por nós. Quando reparamos, já passou e muita coisa ficou pra trás. Hoje desfrutei da canção “O tempo não pára”, na bela voz da cantora Mariza e, ao ouvi-la recordei-me do acidente do submarino Kursk e percebi que a maioria não lembra dessa tragédia. A canção de Mariza fez todo sentido, pois ela diz:
“Eu sei
Que o tempo não pára
O tempo é coisa rara
E a gente só repara
Quando ele já passou”
O tempo passou e já faz quase vinte anos, que li a reportagem “No fundo sós” (Focus nº 45). Aquela tragédia caiu no esquecimento, mas devemos recordar que 118 pessoas morreram abandonadas no fundo do mar e, seus familiares não tiveram a oportunidade de realizar o rito de despedida, como nos dias atuais, aqueles que perderam seus entes queridos, por causa do Covid-19, também ficam privados dos ritos de despedida. Aquelas pessoas morreram por causa do orgulho dos governantes que valorizaram mais coisas e segredos de um submarino, que a vida dos homens que estavam no fundo do mar. Eles ficaram ali, à mercê de ajuda e quando esta chegou, já era tarde. Será que não estamos vivenciando isto em nossos dias?
Os familiares daquelas 118 pessoas ficaram desolados. Enquanto o mundo todo preocupava-se com o que poderia acontecer se houvesse vazamento radioativo no submarino. Como naqueles dias, diante de nossa tragédia da pandemia que estamos vivendo, fala-se sobre tudo, mas percebemos que as famílias estão abandonadas, sofrendo a dor da perda dos seus entes queridos. Como há quase vinte anos, muitos choram seus mortos, sem condições de enterrá-los, sem poder fazer sua despedida, sem poder resgatá-los.
Esta triste situação é desoladora, mas a realidade é que todos nós, em algum momento ou outro, já nos sentimos abandonados, desolados, deixados de lado, sofremos, choramos e tudo o que desejávamos era um ombro amigo. Nos momentos de alegria, é muito fácil estar rodeado de gente, mas na tristeza é bem diferente. O Senhor Jesus, quando estava prestes a ser preso, vivendo um momento angustiante, pediu que seus apóstolos mais chegados estivessem ao seu lado, mas estes adormeceram e o Senhor lhes disse: “Então, nenhuma hora pudeste velar comigo?"(Mt 26.40). O nosso Senhor enfrentou o abandono e o desprezo.
Não consigo imaginar o que passou na mente daquelas 118 pessoas e muito menos dimensionar o desespero e a ansiedade deles, como também, não consigo mensurar o que vai na mente das pessoas que sofrem nos dias atuais. Não dá para avaliar a dor que lhes ia na alma, como também a dos que padecem hoje. Não há como entender o sofrimento dos familiares, mesmo que tenhamos perdido alguém, a nossa dor não é padrão para medir a dor do outro.
O que aconteceu com o submarino Kursk foi uma tragédia sem precedentes. Nosso momento não é diferente, pois diante da tragédia que vivemos, podemos notar que muitos estão interessados em defender a economia, desprezando milhares de vida. Os tripulantes foram abandonados e hoje também, muitas pessoas o são, mas é preciso saber que os homens podem nos abandonar, porém o Senhor jamais irá nos deixar. O Senhor Deus fala através do profeta Isaías: “Pode uma mulher esquecer-se tanto de seu filho que cria, mas ainda que esta se esquecesse, eu todavia, me não esquecerei de ti” (Is 49.15). Os tripulantes e muita gente nos dias atuais são abandonadas pelos homens, mas não por Deus.
Se estás passando por esses sentimentos de desesperança e que desistiram de ti, se pensas que os homens te deixaram, lembra-te que o Senhor te diz: “eu todavia, não me esqueci de ti”. Tu és importante para Deus. Ele lembra-se de ti e não te abandonou e jamais te abandonará.