Credores e devedores

A oração do Pai-nosso é um grande desafio. Ela trata das doutrinas básicas da fé cristã. Doutrinas que estão sendo desprezadas em nossos dias. Jesus diz aos seus discípulos: “Vocês, orem assim: Pai nosso, que estás nos céus! Santificado seja o teu nome. Venha o teu Reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu. Dá-nos hoje o nosso pão de cada dia. Perdoa as nossas dívidas, assim como perdoamos aos nossos devedores. E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal, porque teu é o Reino, o poder e a glória para sempre. Amém” (Mt 6.9-13). A oração do Pai-nosso nos apresenta a doutrina da soberania de Deus. Jesus apresenta-nos Deus como Pai e como Rei. Um soberano deve ser reverenciado. Um pai deve ser obedecido. Um soberano tem toda autoridade. Tem o poder. Também vemos que a oração do Pai-nosso nos descortinada a doutrina da providência. Jesus apresenta-nos o Deus que cuida. A providência é “a atividade do Deus triúno por meio do qual ele (a) provê as necessidades de suas criaturas, (b) preserva todo o universo criado, (c) dirige todos os caminhos individualmente, (d) governa toda obra de suas mãos, (e) retribui todas as obras más e (f) concorre em todos os atos de suas criaturas racionais, sejam atos bons ou maus, de modo que nada escapa ao seu controle.”
A oração do Pai-nosso nos apresenta um Deus misericordioso. Ele é justo, mas na sua justiça age com misericórdia e, é por causa de sua misericórdia que não somos consumidos (Lm 3.22). Enquanto, na soberania, somos convocados a obedecer o Pai e fazer o que Ele determina e em sua providência somos desafiados a confiar na sua provisão e cuidado, na sua misericórdia, somos desafiados a clamar por perdão.
O que aprendemos com este segundo pedido?
Jesus nos ensina que o perdão é essencial para a existência humana. O versículo inicia dizendo: e perdoa as nossas dívidas. Há uma ligação com o versículo anterior. Ou seja, da mesma maneira que carecemos do pão para sobreviver, também carecemos do perdão. Tal como o pão, assim é o perdão para a existência da humanidade. Este é o dilema da nossa sociedade, quando não se perdoa, vive-se a cultura do ódio. Se não há perdão, o que resta é o ódio e a destruição. O perdão é a dádiva da vida. A dádiva de uma nova oportunidade, mas muito mais que isto, é a maneira de dizermos que não nos deixamos destruir emocionalmente e nem destruímos os outros. Jesus nos ensina que a existência humana e sua sobrevivência só são possíveis através do perdão.
Jesus nos ensina que quem pede perdão tem que ser um perdoador também. Jesus afirma que perdão gera perdão. E aqui devemos recordar mais uma vez o que é dito do carácter do discípulo. Jesus afirma que é feliz quem age com misericórdia, pois alcançará misericórdia (Mt 5.7). Não esqueçamos que o perdão é a misericórdia em ação. O Senhor mostra que devemos agir como Deus age connosco. Ele ensina-nos que quem recebe misericórdia e é perdoado deve ser misericordioso e perdoador. Jesus nos ensina que perdão deve gerar perdão. Perdoar é restaurar o outro. É restaurar-se a si mesmo. É restaurar a relação que estava quebrada. Estás disposto a perdoar?
Jesus nos ensina que somos devedores e credores. O pedido que Jesus nos ensina a fazer apresenta a realidade da nossa dívida em relação ao Pai. Estamos em falta diante do Pai. Somos devedores. Carecemos de Perdão, de misericórdia, mas também, Somos credores e devedores relação uns aos outros. Jesus diz que devemos dizer ao Pai: perdoa como nós perdoamos. Implicitamente o que nos é dito é que há uma mutualidade aqui. Somos tanto credores como devedores. Um deve reconhecer sua falha diante do outro.
Se há um lugar onde esta realidade se faz presente é na família. É dentro de casa que devemos aprender a pedir perdão e oferecer perdão.
Jesus nos ensina que como devedores devemos clamar por misericórdia. Precisamos pedir por clemência. Só clama por misericórdia quem reconhece os seus erros. Pedir misericórdia é caminhar na estrada do perdão. Entretanto, o Senhor também diz que como credores devemos oferecer misericórdia e quando estas atitudes são uma realidade em nossas vidas, podemos viver relacionamentos restaurados. Podemos ver pessoas viverem livres da culpa e do fardo da ferida que insistia em machucar simplesmente porque não havia o perdão. O perdão cura as nossas feridas. Ele reestabelece a paz.
Que tenhamos a capacidade de perdoar, assim como somos perdoados para que desfrutemos de vidas saudáveis.