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O outro lado


O alemão, Dietrich Bonhoeffer, que ficou conhecido como o teólogo da resistência, em seu livro Vida em comunhão afirma que “o lugar do cristão não é na reclusão da vida monástica, mas entre os seus inimigos. É ali que está a sua missão e tarefa”. Essa declaração recorda-me a fala de Jesus: “Eis que vos envio como ovelhas ao meio de lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e inofensivos como as pombas” (Mt 10.16). Portanto, a caminhada cristã acontece em terreno hostil, no meio de pessoas que tem posições antagônicas às suas, mas apesar disso é essencial entender que “O povo de Deus viverá em terras distantes, entre os descrentes, mas será a semente do reino de Deus no mundo inteiro”, ou seja, a igreja não defende partido político e muito menos levanta bandeira política, pois ela é representante do reino de Deus nesse mundo. Jesus encarnou e entrou na nossa história e como fez no passado, hoje Ele deseja que sigamos para o outro lado e ir para o outro lado é entrar no território do inimigo. Marcos narra esse fato mostrando que antes de chegarem ao outro lado eles enfrentaram uma grande tempestade e, ao chegarem ao país vizinho, um endemoniado foi ao encontro de Jesus. O texto é muito significativo, deixemos que ele fale por si:


“Ao anoitecer, Jesus disse a seus discípulos: Vamos atravessar para o outro lado do mar. Com ele a bordo, partiram e deixaram a multidão para trás, embora outros barcos os seguissem. Logo uma forte tempestade se levantou. As ondas arrebentavam sobre o barco, que começou a encher-se de água. Jesus dormia na parte de trás do barco, com a cabeça numa almofada. Os discípulos o acordaram, clamando: Mestre, vamos morrer! O senhor não se importa? Jesus despertou, repreendeu o vento e disse ao mar: Silêncio! Aquiete-se! De repente, o vento parou, e houve grande calmaria. Então Jesus lhes perguntou: Por que estão com medo? Ainda não têm fé? Apavorados, os discípulos diziam uns aos outros: Quem é este homem? Até o vento e o mar lhe obedecem! Assim, chegaram ao outro lado do mar, à região dos gerasenos. Quando Jesus desembarcou, imediatamente um homem possuído por um espírito impuro saiu do cemitério e veio ao seu encontro. Esse homem morava entre as cavernas usadas como túmulos e ninguém conseguia detê-lo, nem mesmo com correntes. Sempre que era acorrentado e algemado, quebrava as algemas dos pulsos e despedaçava as correntes dos pés. Ninguém era forte o suficiente para dominá-lo. Dia e noite, vagava entre os túmulos e pelos montes, gritando e cortando-se com pedras. Quando o homem viu Jesus, ainda a certa distância, correu ao seu encontro e se curvou diante dele. Então soltou um forte grito: Por que vem me importunar, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Em nome de Deus, suplico que não me torture! Pois Jesus já havia falado ao espírito: Saia deste homem, espírito impuro! Jesus lhe perguntou: Qual é o seu nome? Ele respondeu: Meu nome é Legião, porque há muitos de nós dentro deste homem. E os espíritos impuros suplicaram repetidamente que ele não os enviasse a algum lugar distante. Havia uma grande manada de porcos pastando num monte ali perto. Mande-nos para aqueles porcos, imploraram os espíritos. Deixe que entremos neles. Jesus lhes deu permissão. Os espíritos impuros saíram do homem e entraram nos porcos, e toda a manada, cerca de dois mil porcos, se atirou pela encosta íngreme do monte para dentro do mar e se afogou. Os que cuidavam dos porcos fugiram para uma cidade próxima e para seus arredores, espalhando a notícia. O povo correu para ver o que havia ocorrido. Chegaram até onde Jesus estava e viram o homem que tinha sido possuído pela legião de demônios. Estava sentado ali, vestido e em perfeito juízo, e todos tiveram medo. Então os que presenciaram os acontecimentos contaram aos outros o que havia ocorrido com o homem possuído por demônios e com os porcos. A multidão começou a suplicar que Jesus fosse embora da região. Quando Jesus entrava no barco, o homem que tinha sido possuído por demônios implorou para ir com ele. Jesus, porém, não permitiu e disse: Volte para sua casa e para sua família e conte-lhes tudo que o Senhor fez por você e como ele foi misericordioso. Então o homem partiu e começou a anunciar pela região das Dez Cidades quanto Jesus havia feito por ele, e todos se admiravam do que ele dizia. Jesus entrou novamente no barco e voltou para o outro lado do mar, onde uma grande multidão se juntou ao seu redor na praia” (Mc 4.35-5.21). 

Quais são as lições que esse texto tem para nós?


O texto ensina que ir para o outro lado é travar uma batalha espiritual. O outro lado, o lado de lá, era a terra dos inimigos, o lugar dos pagãos com seus templos e com povos que exaltavam a violência, a exploração sexual, a cobiça e, além disso, tinham o porco como um animal sagrado, que era utilizado em seus cultos religiosos. Portanto, para os discípulos de Jesus o outro lado era a morada de Satanás. Ademais, o texto mostra que a primeira pessoa que sai ao encontro de Jesus é um endemoniado que foi liberto pelo Mestre. Portanto, o campo de batalha do discípulo é espiritual e jamais político.


A segunda lição que o texto ensina é que as pessoas do outro lado devem ser tratadas com dignidade. Jesus chama os seus discípulos para o outro lado, mas não é para destruí-los, não é para amaldiçoá-los. O objetivo de irem para o outro lado é para cuidar do ser humano, tratá-lo com dignidade e arrancá-lo do poder das trevas. Sendo assim, Jesus nos convoca para ir pro outro lado, para o território inimigo para cuidar daquele que antes era visto como adversário. Estamos dispostos a cuidar e restaurar aqueles que consideramos inimigos?


Por último, ir para o outro lado é entender que o inimigo deve ser amado e não destruído. Recordemos as palavras do Mestre: “Vocês ouviram o que foi dito: Ame o seu próximo e odeie o seu inimigo. Eu, porém, lhes digo: amem os seus inimigos e orem por quem os persegue” (Mt 5.43-44). Portanto, ir para o outro lado é valorizar o ser humano e demonstrar que não se deseja a destruição dele, mas, e acima de tudo, é dizer que deseja se relacionar com ele de maneira pacífica. Estás disposto a fazer isto?


Jesus desafia os seus discípulos a seguirem para o outro lado. Ele mostra que a batalha do seu povo é contra as hostes espirituais da maldade, mas que as pessoas devem ser amadas e tratadas com dignidade. Jesus desafia-nos a ir ao encontro daqueles que consideramos inimigos e mostremos amor a eles. Estás disposto a fazer isto?

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