Poderia ter sido comigo

Este ano será definido como o ano das perdas. É o de todas as tragédias e o que um vírus modificou toda a maneira de viver da sociedade. E o tema que mais as pessoas evitam falar se fez presente em todos os lugares, pois a morte virou notícia em todos os lugares. E, por causa dela, a vida tem tomado um novo significado, as relações estão sendo revistas e o amor, bem como escreveu Rubem Alves: “E o amor, a coisa mais alegre, revela-se como a coisa mais triste. Diante da morte, o amor ganha cores trágicas”.
Os amantes de futebol receberam a notícia da morte do “el pibe”, Diego Armando Maradona, seu frágil coração não aguentou mais. El pibe volta a ser notícia e falam da sua genialidade em campo, mas vi Casagrande, um antigo companheiro e um ser humano que enfrentou os mesmos problemas que Maradona dizer: “Poderia ter sido comigo. Foi com ele, mas poderia ter sido comigo há muitos anos.” A declaração que surgiu emocionada está relacionada com o fato de Casagrande se reconhecer como um dependente químico e Casão termina dizendo que sua maior loucura é estar sóbrio. Mas, será que nós temos consciência de que a morte poderia ter chegado a nós?
O ano está marcado por perdas. A morte levou-nos muita gente e de alguma forma, estamos vivenciando um luto coletivo. E apesar de tudo, este ano de crise, nos faz olhar para a vida, a nossa própria e como a temos vivido, se é que vivemos, pois muitos apenas existem e, é nesse olhar que que percebemos a possibilidade da nossa própria morte, fato que muitos não gostam de pensar. Contudo, devemos ter claro o que diz a Escritura: “Para tudo há uma ocasião certa; há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu: Tempo de nascer e tempo de morrer, tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou”. (Ec 3.1-2) e, como diz o povo: “A morte e única coisa certa da vida”.
Poderia ter sido comigo, mas também poderia ter sido contigo e mesmo que não pensemos no dia da nossa morte, ela pode chegar a qualquer momento e sendo assim, é essencial pensar como estamos vivendo para que não se diga de nós no final como a canção “O velho” de Chico Buarque:
"O velho vai-se agora
Vai-se embora
Sem bagagem
Não sabe pra que veio
Foi passeio
Foi passagem
Então eu lhe pergunto pelo amor
Ele me é franco
Mostra um verso manco
De um caderno em branco
Que já se fechou"
A vida é para ser vivida. Não viemos aqui para ser passagem. Viemos para viver e não apenas existir. Infelizmente só pensamos na vida e como temos vivido diante da morte e isso acontece porque “a Morte nunca fala sobre si mesma. Ela fala-nos sempre sobre aquilo que estamos a fazer com a própria vida, as perdas, os sonhos que não sonhamos, os riscos que não corremos (por medo), os suicídios lentos que perpetramos.”
Casagrande disse: “Poderia ter sido comigo” e, mostra-nos a consciência que, quem vive precisa pensar que a morte pode chegar a qualquer momento e muito mais que isso, é preciso saber que: “A morte tem o poder de colocar todas as coisas nos seus devidos lugares”. Entretanto, poderia ter acontecido com ele, mas também comigo ou contigo e, se acontecer fica-nos por responder a pergunta do Mestre: “Louco! esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será?" (Lc 12.20)